Vírus são microrganismos um tanto quanto astutos. Alguns são transmitidos muito rapidamente, outros são muito letais e a maioria é até essencial para a vida na terra. Mas uma coisa é comum a todos eles: todos dependem de um hospedeiro para sua reprodução.
Porém, vamos do começo.
Um vírus é basicamente um conjunto de moléculas que formam um envelope viral feito de lipídeos e proteínas (alguns vírus não possuem o envelope), um capsídeo - feito de proteínas que protegem o material genético viral, que por sua vez pode ser DNA ou RNA. Não existe ainda um consenso científico que defina se os vírus são seres vivos ou não. Isso ocorre, sobretudo, porque eles não possuem um metabolismo próprio e, por isso, precisam ficar procurando hospedeiros por aí. Esses hospedeiros - as vítimas de um vírus - podem ser praticamente qualquer ser vivo desde bactérias até nós mamíferos. Acontece que existe um grupo de hospedeiros em especial que favorece o surgimento e transmissão de muitos vírus problemáticos, como os coronavírus ou a raiva, por exemplo, e esses hospedeiros são os pobres morcegos.
Nossos parentes alados são um grupo especialmente peculiar, justamente pela sua exclusividade em relação aos outros mamíferos: eles voam ativamente batendo suas asas (diferentemente de esquilos voadores, que apenas planam). Esse voo ativo causa um consumo imenso de energia do morcego. Com o sistema energético sobrecarregado, o corpo do morcego acaba produzindo muitos resíduos tóxicos que normalmente o matariam. Todavia, a evolução fez o seu papel e as células dos morcegos são muito mais resistentes a danos no material genético do que as nossas. Dessa forma, um vírus pode entrar no DNA de um morcego sem causar muito alarde.
Devido ao voo, também, os morcegos possuem ossos ocos, para diminuir o peso corporal. Acontece que o interior dos ossos é o lugar onde fica a medula óssea e, portanto, os morcegos não a possuem. A medula é uma matriz que produz diversos componentes importantes do sistema imunológico, dessa forma, os morcegos não possuem algumas respostas inflamatórias que ajudam a eliminar vírus.
Outro ponto importante na epidemiologia relacionada aos morcegos é que, geralmente, eles vivem em grandes colônias, o que facilita a propagação de doenças entre os indivíduos. Além do mais, muitas sociedades ainda consomem a carne de morcego como herança cultural.
Então, por que não acabamos com os morcegos de uma vez?
Primeiramente, nós humanos também precisamos assumir nossa culpa nesse problema. O contato de morcegos com humanos ou animais domésticos é causado, sobretudo, por causa da destruição e urbanização de habitats que pertencem aos morcegos. Eles também têm um papel importantíssimo na economia e na própria sobrevivência da humanidade, afinal, os morcegos são polinizadores. Juntamente com os pássaros, as abelhas e diversos outros insetos, os morcegos impulsionam a produção de inúmeros produtos vegetais que precisam da polinização feita por animais. A produção de algumas frutas, por exemplo, seria impossível sem os nossos queridos morcegos.
Toda essa discussão ainda é muito prematura, pois ainda não entendemos completamente todos os fatores que causam o surgimento de uma nova doença viral transmitida pelos morcegos. Mais dados de zoologia, epidemiologia, ecologia e virologia ainda são fundamentais para entender o problema de saúde pública que enfrentamos e ainda enfrentaremos mais vezes. Até lá, todavia, é preciso ter consciência da nossa relação abusiva em relação à natureza e da nossa responsabilidade como espécie.
Até mais e obrigado pelos peixes. Digo, pela atenção.
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